segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Uma boa dose de realidade


|ESPECIAL

A III Mostra de Cinema Brasileiro do Centro Cultural Sesi inicia com chave de ouro, apresentando a crua e lírica poesia de Patativa do Assaré. O BulaMais compareceu e, à convite da organização, estará presente até o fim do evento.

Não deixe de conferir nossos textos especiais sobre a Mostra!



Isaac Moraes

Foi com muita precisão e firmeza que a equipe do Cine Sesi Pajuçara apertou o play e deu início, na noite da sexta-feira, 27 de novembro, ao Sesi Brasil - III Mostra de Cinema Brasileiro. O projeto, que traz como tema a frase “o país, além do óbvio”, chega a sua terceira edição trazendo ao público trinta filmes distintos, com temáticas diferenciadas. A geléia geral cinematográfica vai até o dia 04 de dezembro, com o objetivo de revelar o amor, a santidade e o desbunde de um Brasil multifacetado.

Já na primeira noite, um “se liga” nos desavisados. O documentário Patativa do Assaré: Ave Poesia, de Rosemberg Cariry, expôs, de forma por vezes cruel à comodidade reinante no ambiente, um dos lados mais líricos e sofridos dos nordestinos, na figura de um em especial. E põe especial nisso. 

O cearense Antonio Gonçalves da Silva, o Patativa do Assaré, com certeza foi apresentado da melhor maneira aos que lá estiveram para ver o documentário. Os que já o conheciam pelos distantes versos cantados por Luiz Gonzaga em “A Triste Partida” se surpreenderam com a profundidade melódica, poética e intelectual do grande mestre.

O filme de Rosemberg Cariry possui um caráter intimista muito forte, devido sua ligação afetiva com Patativa (segundo o próprio diretor, ambos eram compadres). No entanto, isso em nenhum momento transparece de forma negativa, piegas ou com aquela atmosfera falsa, típica da “rasgação de seda”. A figura de Patativa aparece, a todo o momento, atuante, independente e conduz o rumo do documentário, não precisando utilizar de forma excessiva, e como muletas, depoimentos de terceiros para seu desenvolvimento.

“Esse documentário é um olhar bastante particular sobre Patativa do Assaré. Fiquei bem, senti ter feito justiça quando terminei. Com sua voz viva e profunda, Patativa teve uma extrema importância cultural e também política no Brasil, pois sua poesia foi muito utilizada pelos militantes para agredir a burguesia, apesar do próprio Patativa não ter partido político. Seu processo de mitificação começou ainda em vida, e talvez tenha sido por isso que eu resolvi começar com cenas de sua morte, seu velório, e terminar com relatos de seu nascimento, porque a morte é também um renascimento, uma transformação. Isso faz parte do lado místico, lírico e amoroso de Patativa”, afirma o diretor.

No fim da sessão, percebia-se bem a emoção e os intelectos mexidos de forma evidente. Em cada um, o desejo de ficar mais quieto, refletindo. Através do filme, “que apenas serviu de cavalo para a manifestação do grande Orixá”, como colocou pertinentemente Rosemberg Cariry, ficou claro que os significados de genialidade e intelectualidade transcendem a qualquer saber ou título acadêmico. 

Uma boa dose de humildade e realidade não faz mal a ninguém e há tempos que o Cine Sesi necessitava apresentar algo assim ao seu público mais assíduo. Ficou um gostinho de "quero mais" dessa Mostra e de ler e ouvir Patativa do Assaré. O objetivo do primeiro dia foi alcançado.

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